A MORTE DO GEMADA

      Ah! descuidos! descuidos!... Quanta desgraça, quanta perda, quanta tristeza êles causam ... e a gente não se emenda, sempre a cair nêles! ...
     Por um descuido tive já um grande desgôsto. Foi assim:
     Andávamos numa caçada de tatus.
     Havia muito.
     Para não perder tempo a cavar o buraco até tirar o tatu, e enquanto cuida-se de um, outros escapam-se, eu usava assinalar as tocas: a primeira , a segunda, etc. e assim por diante as que encontrava ocupadas, de forma que num momento garantia seis, oito, dez tatus.
     Para assinalar o processo é simplíssimo: achado o tatu, cava-se um pouco, até descobrir-lhe a cauda, e então, com uma embira ou cipó, amarra-se na dita cauda uma estaca, formando cruz. E pronto. Larga-se. O tatu procura logo cavar pra diante, é claro, mas não avança, que a cruz do rabo, ficando atravessada na bôca da toca, não deixa.
    Percebem?
    Experimentem: não nega fogo!
    Pois um dia, não tendo à mão uma estaca, e para não perder tempo, amarrei pelo rabo um enorme tatu ao cabresto do meu estimado baio, o Gemada.
    O tal senhor tatu foi cavando ... cavando ... entrando terra adentro : o cavalo, muito dócil, sentindo-se puxado, cedento e foi indo ...
    E o tatu foi penetrando ... e o cavalo foi cedento.
    A bôca da toca era grande; o Gemada, muito manso, meteu o focinho, a cabeça , lá dentro; o tatu puxou mais e o cavalo cedeu, ainda. Quando não pôde ceder mais, e justamente por isso, o tatu fêz ainda maior finca-pé. Quem é caçador sabe que fôrça tem no rabo o tatu ...
    Travou-se por certo luta renhida: o cavalo puxando para fora e o tatu para dentro.
    Quando voltei ao lugar encontrei o meu Gemada sufocado, asfixiado, morto, com a cabeça como uma rôlha metida no gargalo da toca! ... E ainda perdi o cabresto, que tive de cortar.
    Quase um ano depois, vim a pegar aquêle mesmíssimo tatu, que conheci porque ainda trazia de arrasto o dito cabresto ...
apenas com as argolas mui gastas de roçarem pelo chão.
     Uma cousa de admirar foi o bem atado que ficou; verdade que fiz -- como de costume -- um nó de soga, a preceito, legítimo nó de Romualdo !