PERDA

Arashi no youni hashiru itami yo
Sashida shita te ga chikara suki temo
Kibou wo suteru na
Yuuki no honoo
Hitomi wo sorasu na
Tatakai wa ima owaru
 

 

Um vento seco soprava naquele vale quase sem vida, e se infiltrou por entre seus longos cabelos, mas ele mal se apercebeu disto. Seu elmo caiu de sua mão e foi depositar-se no solo arenoso do Vale da Morte, em um baque surdo.

Ele ficou olhando o vazio, incapaz de se mexer. Aos poucos suas pernas foram fraquejando e ele deixou-se cair de joelhos, trêmulo. Tinha consciência dos outros atrás dele, guardando uma certa distância, um clima de incerteza no ar. Ainda não conseguia chorar. Sentia um bolo na garganta, seus olhos ardiam, mas as lágrimas simplesmente não vinham. Ele quase torcia para que viessem logo, mesmo sabendo que talvez não fosse capaz de estancá-las, uma vez liberadas.

Não entendia o que acontecia. Talvez tudo aquilo fosse tão inacreditável e absurdo que sua mente ainda não conseguia aceitar completamente.

Teria ficado ali para sempre, não fosse uma mão em seu ombro, de repente. Uma mão amiga. Ele elevou o olhar. Era Hyoga. Ele olhava para Shun, consternado e com pesar no olhar.

"Você está bem?" perguntou Hyoga, tendo consciência imediatamente do quanto era ridícula a pergunta. É claro que ele não estava bem. Para começar, onde estavam as lágrimas de dor pelo irmão perdido? Nem sinal... apenas aquele olhar assustadoramente vago e distante.

Shun se levantou, sem responder. Abaixou-se e pegou o elmo de sua armadura. Colocou-a debaixo do braço, e olhou para Hyoga, ou melhor, através dele. Aquela mesma expressão vazia.

"Podemos ir." disse Shun, a voz igualmente inexpressiva. Ele adiantou-se em direção ao demais. Hyoga, levemente confuso, seguiu atrás dele em direção onde Seiya e Shiryu aguardavam.

"Veja, Shiryu, lá vem eles!" disse Seiya, e adiantou-se para encontrá-los, mas a mão de Shiryu segurou seu braço. Seiya olhou para o amigo, o cenho franzido.

"Nani?..."

"Seiya... não fale com Shun agora." pediu Shiryu, a expressão muito séria. Ele percebera o vazio no rosto de Shun, e também a expressão preocupada de Hyoga.

"Mas... por quê?" Shiryu suspirou. Seiya era lento em entender certas coisas.

"Você não está notando o jeito de Shun? Ele está em estado de choque. Melhor não falarmos com ele, por enquanto." Shiryu na verdade temia que o jeito precipitado do cavaleiro de Pégasus tornasse as coisas piores do que elas já estavam.

"Bem... é, você tem razão, Shiryu." Seiya admitiu, e olhou para Shun com mais cuidado, agora.

O cavaleiro de Andrômeda aproximou-se deles, com a cabeça baixa. Aparentemente, ele decidira-se fechar em si mesmo, sem chance de deixar ninguém entrar em seu pequeno mundo de dor. Quanto tempo ele permaneceria assim, era uma preocupação que se instalara na mente dos outros três cavaleiros de bronze, enquanto eles andavam juntos em direção ao helicóptero que os aguardava em uma depressão a alguns metros dali.
 
 
 
 

***


 
 
 

Remember
Omae wo sodateta kono nagai michi nori
Remember
Omae ni sosogareta hohoemi ni
Shouri wo chikae
Remember...
 

 

A viagem de helicóptero parecia algo irreal. Cada um perdido em seus próprios pensamentos. O silêncio era quase algo palpável. Os quatro haviam retirado suas armaduras, cujas partes se encontravam no chão do helicóptero, como despojos esquecidos de uma batalha há muito encerrada. Entre elas, se destacando por seu brilho quase ofensivo, a máscara da armadura de Sagitário. Um amargo prêmio pela batalha vencida. Um lembrete de que ainda havia muitas batalhas pela frente em busca do restante dela.

Seus corpos estavam exaustos, feridos, as roupas rasgadas... eles se encontravam fisica e mentalmente exauridos.

Seiya parecia o mais calmo, e com a cabeça apoiada nos joelhos dobrados, ele cerrava os olhos de vez em quando, num quase cochilo. Seu corpo ainda exibia algumas marcas deixadas pelo golpe do Pégasus Negro, manchas escuras que ainda demorariam a abandonar sua pele.

Shiryu olhava a paisagem pelo vidro da janela, e subitamente a imagem das cinco montanhas lhe veio à mente, juntamente com a lembrança do Mestre Ancião e Shunrei. Ele soltou um suspiro, e sentiu uma pontada no lugar onde o Dragão Negro o atingira mais duramente. O lugar ainda sangrava um pouco, e ele forçou a mão contra o ferimento, tentando estancá-lo.

Shun encostou a cabeça na parede do recinto e fechou os olhos, apertando-os com força.

Se isto era um pesadelo, ele queria acordar, o mais rapidamente possível.

De frente para ele, dentro do helicóptero, Hyoga o observava discretamente. Estava preocupado. Shun não estava agindo como ele mesmo, desde que presenciara o irmão mais velho morrer diante dele...

Aquela fora uma batalha dura e difícil. E nada justa, para ambas as partes envolvidas. No último momento, Ikki se arrependera, era verdade, mas... isso não impedira seu trágico fim. E agora, Shun, que passara anos na Ilha de Andrômeda treinando, se tornando um cavaleiro contra sua vontade, com o único e firme objetivo de rever o querido irmão... Ele se fora, bem diante de seus olhos. O que deveria ter se tornado um momento de incrível felicidade para Shun acabara resultando em um terrível pesadelo.

Hyoga sabia o que era perder um ente querido. Ele já estivera lá, ele sabia muito bem o que Shun deveria estar sentindo. Mas essa alienação do jovem rapaz era preocupante. O que ele estava tentando fazer, provar que era forte, que não precisava demonstrar as emoções que certamente deviam estar explodindo dentro dele?

Um lampejo de dor em seu peito o distraiu por um momento de sua preocupação com o amigo, e ele deixou escapar um gemido, segurando o lugar onde Ikki quase atingira seu coração.

"Como está, Hyoga?" A voz de Shiryu chegou a seus ouvidos, e ele olhou para o chinês de longos cabelos negros. Tentou sorrir, mas tudo que conseguiu foi um esgar de dor.

"Já estive melhor, eu acho..." ele conseguiu dizer. "Você também não está nada bem, Shiryu." ele observou, notando que o cavaleiro de dragão também segurava o próprio peito.

Seiya levantou a cabeça e olhou para seu companheiro.

"Shiryu?..."

"Eu vou ficar bem." ele afirmou, "Estou feliz que isto finalmente tenha chegado ao fim..." ele deixou a voz morrer, sentindo-se culpado, e lançou um olhar de desculpas para Shun. Mas este continuava com os olhos fechados, sem parecer de dar conta do que acontecia à sua volta.

De repente, Shun abriu os olhos e os fixou em Shiryu.

"Shiryu... me desculpe por ter usado as correntes em você naquela hora. Gomenasai." sua voz era quase um sussurro, mas parecia mais normal do que o tom que ele usara lá atrás no Vale da Morte. Shiryu piscou, desconcertado.

"Daijoubu, Shun." ele respondeu, sem acreditar. Shun acabara de perder seu irmão de maneira trágica e estava agora se desculpando com ele por algo totalmente irrelevante. "Não tem importância. Não precisa se desculpar."

"Mas eu não devia ter feito aquilo..." ele insistiu, um incrível tom de lamento na voz.

"Você só fez o que pôde para resolver a situação sem precisarmos lutar, Shun. Infelizmente..." ele engoliu em seco, fitando o olhar triste do amigo, "infelizmente não deu certo. Mas... seu irmão se arrependeu no último minuto, por isso, o que você fez por ele, valeu a pena. Não se esqueça disso."

"Eu não fiz o suficiente..." A voz de Shun começara a falhar, e seu corpo se sacudia levemente. As tão sofridas lágrimas finalmente explodiram de seus olhos, correndo livres por seu rosto delicado, e ele soluçou alto. "Não foi o suficiente..."

Hyoga assistira calado o desenrolar da conversa mas quando Shun começou a chorar ele levantou-se de onde estava e sentou-se ao lado do amigo, e sem dizer nada, pois palavra alguma poderia jamais aplacar ou aliviar a dor que consumia seu companheiro; em silêncio, Hyoga passou o braço por cima dos ombros de seu amigo, que agora chorava sem restrições.

"Oniisan..." Shun soluçou baixinho, apoiando a cabeça no ombro de Hyoga enquanto as lágrimas corriam livremente. Hyoga reforçou o abraço em torno dos ombros do amigo.

"Shun..." Seiya murmurou preocupado.

"Ele precisa chorar. Vai lhe fazer bem. Ele finalmente saiu do choque." afirmou Shiryu.

Nada mais certo, pensou Hyoga, continuando a confortar o amigo que se encolhera junto a seu peito e continuava chorando desconsoladamente. Chore, Shun. Nem todas as lágrimas do mundo poderão aliviar essa dor que você está sentindo. A dor não irá embora, mas você aprenderá a conviver com ela, como uma cicatriz em seu coração que sangrará de vez em quando...

A imagem do rosto de sua mãe lhe veio à mente, e ele apertou os olhos com força, tentando afastar a lembrança dolorosa. Por quê a lembrança de sua mãe tinha que causar-lhe tanta dor? Por que uma sombra tinha que invadir suas memórias sobre a mãe sempre que ele pensava nela, se memórias era tudo que ele tinha dela?

Não quero pensar nisso agora. Shun precisa de apoio.

Hyoga abriu os olhos e baixou o olhar para o amigo, sentindo-se aliviado ao ver que seu choro amainara um pouco, se transformando num murmurar muito baixo, entremeado de soluços que cortavam o coração de alguém.

Seiya e Shiryu desviaram o olhar, com pesar. Hyoga começou a acariciar o cabelo de Shun, com extremo carinho, como se ele fosse uma criança pequena.

Aos poucos, Shun foi diminuindo o choro, até parar completamente. Mas continuou com a cabeça encostada junto a Hyoga, alguns soluços ainda sacudindo levemente seu corpo. Alguns minutos depois, ele afastou-se um pouco de Hyoga, e olhou-o nos olhos. Sua expressão estava normal, agora. Era o Shun que todos conheciam, novamente. Com uma nova tristeza, pungente e melancólica nos olhos, agora... mas ainda era o Shun.

Você não é tão fraco assim, amigo. Você vai ficar bem. Eu sei que vai.

Hyoga retirou o braço que passara sobre os ombros de Shun e apertou-lhe o ombro, firmemente. Ele era conhecido como o Cavaleiro de Gelo, mas seu sorriso para o amigo foi caloroso, cheio de compreensão e compaixão. Shun, incrivelmente, consegiu sorrir de volta, e olhou para seus outros dois amigos, uma nova certeza marcada em seu olhar.

"Seiya... Shiryu..." ele começou, levantando a cabeça com decisão, "Amigos... eu não vou deixar o sacrifício de meu irmão ser em vão. Eu vou vingar a morte dele... e reaver as partes que faltam da armadura. Eu juro pela memória de meu irmão que farei isso, nem que me custe a vida."

Hyoga estava impressionado. Shun parecia... amadurecido? Incrível, ele passara em questão de horas de um garoto assustado e nada confiante em si mesmo a este rapaz que agora falava com uma voz firme, sem tremer, nem mesmo ao tocar no nome do irmão perdido.

Seiya e Shiryu piscaram, surpresos. Mas acabaram sorrindo também.

"Estamos com você, Shun." declarou Seiya simplesmente, estendendo a mão à frente, em direção ao cavaleiro de Andrômeda. Após, alguns momentos, Shiryu fez o mesmo, colocando a própria mão em cima da do cavaleiro de Pégasus. Hyoga foi o seguinte a fazer o mesmo, pousando a mão sobre a de Shiryu. Shun afinal firmou sua mão trêmula mas ainda decidida junto com as dos amigos.

Uma lágrima solitária descia por seu rosto de menino-homem.

"Minna...Arigatou." Shun murmurou, fechando os olhos em agradecimento.

Eles apertaram-se as mãos fortemente, uma promessa selada em silêncio, e que jamais seria quebrada, enquanto eles estivessem vivos.

 Por Athena. Por Ikki. Por eles. Esse era seu destino, daqui por diante, sem chance de volta.

O resto da viagem seguiu em completo silêncio, novamente cada um perdido em seus pensamentos... mas o clima mudara. Havia uma nova força presente, algo se modificara. Os quatro sentiam que iriam até o fim do mundo por um só objetivo em comum, sem qualquer hesitação.

E entre os quatro deles, o mais jovem cavaleiro, Shun, o cavaleiro de Andrômeda, passara por uma experiência traumatizante e deveras triste, mas ao que tudo indicava, algo dentro dele crescera, se transformara. Esse era um novo Shun.

Hyoga olhou para o amigo que agora exibia uma expressão totalmente calma no rosto cheio de uma nova determinação. Ele se perguntou o que devia estar passando por sua mente agora. Afinal, vencido pelo cansaço, ele deixou sua cabeça encostar-se na parede do helicóptero e fechou pesadamente os olhos, permitindo-se um breve cochilo.

Em breve, todos dormiam, à exceção de Shun. Este olhava para o céu pela janela, observando os tons púrpura do sol poente invadirem o céu que escurecia.

Oniisan... Isto não é o fim. Pelo menos, não para mim. Eu sei que iremos nos encontrar novamente um dia. Tenho absoluta certeza disso. Quando isto acontecer, você terá muito orgulho de mim, oniisan. Eu lhe juro...

O rosto de Ikki aflorou em sua mente, uma expressão sempre protetora e cheia de amor pelo irmão mais novo em sua face, algo a que o jovem cavaleiro se acostumara desde que eles eram pequenos. Os lábios de Shun se abriram em um sorriso sem que ele percebesse.

Somente um sentimento, uma palavra, o guiaria agora, algo que nunca o abandonaria não importa o que acontecesse.

Esperança.

Sayonara, meu querido oniisan.
 


Este conto é de autoria de Lalachan, 1995/1998. (Já ouvi falar de contos demorados, mas isto é ridículo... ^_^). Não possuo direito algum sobre Saint Seiya, eles pertencem a Masami Kurumada e Shonen Jump.
Esta aqui é dedicada a você, Paula-chan. ^_^ Você me despertou uma incrível nostalgia por Cavaleiros e eu terminei esta história por sua causa... espero que goste!! ^_^
Trechos da música: "Remember", do vol. 1 de Saint Seiya.



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