Rebeca
Matta e a Trip MPB
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Ou: "Fossa-Nova Tum-Tum-Tum"
Rebeca Matta é uma cantora baiana lançando um cd. Pensou em Gal, Bethânia, Daniela Mercury, Ivete Sangalo? Não tem nada a ver. Ou tem, sei lá. O fato é que ela está colocando seu disco no mercado no peito e na raça, sem pai nem mãe nem gravadora nem selo. Parabéns.O estilo da moça é trip MPB, avisando que é mais aquela MPB prafrentex tipo Tomzé, Arnaldo Antunes, Lenine, do que a MPB engravatada e acomodada. Com bases eletrônicas, samplers, ruídos estranhos e climas idem, a fim de justificar o "trip". Portishead, Moloko, Bjork. Inclusive Rebeca tem um alcance de voz tão extenso quanto a cantora islandesa, indo do mais tradicional timbre de cantora de churrascaria até um inesperado canto lírico, voz sussurrada, gritos em inglês, agudos quebra-copo.
O disquinho ("Tantas coisas") traz 13 faixas, composições próprias e versões bem diferentes para clássicos como "O meu amor", de Chico Buarque, e "Como uma onda", de Lulu Santos/Nelson Motta. Abre com "O mar", uma ambient music que incomoda, timbre irritante de guitarra fazendo contraponto com vocal melódico. Bom para assustar hare-krishna no ônibus. Já a faixa 2,"Tantas coisas", é um clássico instantâneo, o elo perdido entre Elis Regina (safra seventies) e Portishead, dava até para ser um hit de rádio, se as rádios não fossem surdas.
"O fogo dos teus olhos" é bem Bjork, vocal adocicado, letra legal, gritos de novela. Hit em potencial. "Barracão" ganhou uma versão R'n'B de motel dando pane (o R'n'B, não o motel). "A gente se perdeu" tem percussão, flautas tipo Camel Trophy, paradinha tecno-árabe. Levada contagiante. A sexta faixa, "O amor é velho - menina", é das melhores. Rebeca transformou o original de Tomzé em uma canção-colagem onde alternam-se trechos de vocal clássico com um rock (naquelas) em andamento de valsa. Só ouvindo mesmo.
O clássico "O meu amor", uma das mais belas composições de Chico Buarque de Holanda, virou um som new age, só uns barulhos, e a melodia vocal em cima. Que originalmente era cantada pela então esposa de Chico, Marieta Severo, e a então atriz Elba Ramalho. Que responsabilidade. "O anjo" tem loops e microfonia, percussão na linha "boing-boom-tchack" - a música só tem meio, praticamente. "Nada será como antes" (Milton Nascimento/Ronaldo Bastos) lembra o industrial europeu, a linha de baixo gruda no ouvido e não vai mais embora."Cidade" é um drum'n'bass à brasileira, nervoso e com uns toques de samba.
"De qualquer jeito" é das melhores, vocal distorcido cantando letra jóia, aquela prosa poética insistente e cheia de voltas, parente de Itamar Assumpção, mas acho que eles não se falam. "Como uma onda no mar" é mais uma versão para o hit de Lulu Santos, gravado já por dezenas de artistas, Tim Maia, Caetano etc. Na verdade ficou irreconhecível, mal dá para reconhecer a letra sussurrada sobre uma bateria com efeitos eletrônicos. Bom para assustar aquele seu amigo clubber que diz odiar rock nacional. "Nua como a lua" fecha a bolachinha com um belo e singelo arranjo de cordas emoldurando a voz de Rebeca, uma paradinha com pizzicato e é isso.
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Para saber mais sobre a cantora Rebeca Matta:
Praga tecno - traz uma entrevista com Rebeca
Diario do Povo - entrevista e bate-papo entre ela e Stela, outra revelação nordestina, procure nas edições passadas