Jorge Lucio de
A
publicação de A
Compõem essa primeira antologia de Creeley em língua portuguesa cerca de 40 poemas em sua grande maioria traduzida por Bonvicino (que contou ainda, nesse sentido, com a ajuda de João Almino, Darly Menconi e Ruy Vasconcelos). Foram como ele mesmo declara "os primeiros resultados de três anos de convivência e reflexão a respeito da vida, das idéias e da poesia de Robert Creeley - que (…) transcendem (quaisquer outras) etiquetas, para se firmarem como essenciais para as gerações subseqüentes e para a poesia, como um todo, superando, também a fronteira norte-americana".
Acompanham a coletânea quatro pequenos ensaios (três da autoria de Bonvicino - "Breve nota sobre a poesia de Robert Creeley", "Bakhtin, o corpo, Creeley e Girondo" e "Estúpida simples luz do sol" - e um de Vasconcellos - "Um carnaval solipsista"), um depoimento ("Espaços" - traduzido por Regina Alfarano), uma entrevista e alguns comentários do próprio Creeley (que inclusive sugeriu, pessoalmente, a inclusão de alguns poemas), colhidos quando de sua visita ao Brasil em 1996.
Embora Creeley já tenha, ao longo de seus quase setenta anos de idade, publicado muitas obras (sua bibliografia completa - contabilizando-se tanto a poesia e a prosa quanto os ensaios, entrevistas, coletâneas, organizações e prefácios - gira em torno de oitenta títulos), as obras cobertas por A um - título retirado de um das linhas do poema 'Este mundo' ("O que se/perde,/se recobra./O que importa a um/neste mundo?") - são: The Charm (1945/62), For love (sua primeiríssima antologia, editada pela Scribners, em 1962), Pieces (1969), Words (1967), Thirty things (1973), Backwards e Later (1975), Selected poems (1976), Memory gardens (1982), Windows (1988) e Echoes (1994).
Robert White Creeley nasceu em Arlington, Massachusets, em 21 de maio de 1929. Tendo abandonado a universidade (Harvard) no último semestre, foi, durante a Segunda Guerra, para a Birmânia e para Índia, onde serviu como motorista de ambulâncias. Em seu retorno aos Estados Unidos, apaixonou-se pelo jazz, começando a publicar em pequenas revistas na década de 40. No início dos anos 50, viveu na França, Espanha (em Majorca, entusiasmado com os baixos custos operacionais, fundou a Diver Press - pela qual editou três de seus cinco primeiros livros: The kind of act of, The gold diggers (contos) e A snarling garland of xmas verses (anônimo) entre 1953 e 1954), Guatemala e Finlândia. Em 1955, graduou-se no Black Mountain College (Carolina do Norte), associando-se a Charles Olson e Robert Duncan e tornando-se, por três anos, editor da famosa Black Mountain Review. Após o fechamento da instituição, mudou-se para São Francisco onde travou contato com o movimento Beat através Jac Kerouac e Allen Ginsberg. Ao longo da década seguinte, como que sintetizando algumas das mais drásticas linhas de força da época, sua poesia se revela e consagra, criticamente. Desde então divide seu tempo entre o ensino universitário (leciona na Universidade de Nova York, em Buffalo, onde reside), conferências e a composição propriamente dita.
Seu nome se destaca facilmente no horizonte da poesia pós-moderna. Ombro a ombro com as escrituras matrizes de Wallace Stevens, Marianne Moore e William Carlos Williams (sua maior influência - em função da facilidade de apego à contemplação 'objetal' - juntamente com o ímpeto "proprioceptivo" do projective verse de Olson), a dicção creeliana tem aberto caminhos para muitas revitalizações da poesia norte-americana. Ao lado de Louis Zukofsky e John Ashbery, entre outros 'contemporâneos' seus, Creeley é, sem dúvida, uma referência obrigatória para toda poesia instaurante.
Ao mesmo tempo simples e complexa (em Creeley, a simplicidade é diretamente proporcional à complexidade), seus poemas telegráficos (por vezes, crípticos, randômicos e de grande compressão sintática), "brota(m) muito - como afirma Vasconcelos - (de um certo) solipsismo (grifo meu) matizado por informações eruditas que entram em estado de amálgama com um certo acesso direto dos sentidos à realidade (…) sem, no entanto, tecer essa realidade como mero instantâneo fotográfico de intensa plenitude da atenção".
Tal impressão de isolamento e incomunicabilidade (que, para alguns gostos, certamente incluiria Creeley no rol maldito dos 'herméticos') amiúde se confirma quando nos deparamos com seus versos heteróclitos que dão a impressão de 'iniciarem' e/ou 'terminarem' no meio de um (belo) pensamento ("Coisas simples/alguém quer dizer como, qual o dia/como, lá, ao longe -/quem sou eu/e onde"). Na verdade, essa 'gagueira' pressupõe muito mais do que parece: entre outras coisas (que mereceriam ser ditas, mas que não cabem no espaço exíguo de uma resenha), um aguçado projeto de desnudamento do eu (ego-less) e a hipótese de uma espécie de 'retroalimentação' imagética que, no calor de seu processo, lançaria sempre mão de inusitadas técnicas de quebra formal.
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