Jorge Lucio de Campos
Paul
Klee. Separação à noite, 1939.
Se algo de saída impressiona
no escritor inglês Tim Parks é a sua prolificidade. Ainda relativamente jovem
(tem 43 anos), ele já concebeu e publicou, ao longo de uma carreira literária
de apenas treze anos, nada mais nada menos do que dez romances, quase todos
excepcionalmente acolhidos tanto pela crítica quanto pelo público. Conquistou
com seus dois primeiros títulos três importantes prêmios: o Somerset Maughan
Prize e o Betty Trask Award (com Tongues of Flame, em 1985) e o
Llewellin Rhys Memorial Prize (com Loving Roger, no ano seguinte).
Depois vieram, quase que num fôlego contínuo, Home thoughts (1987), Family
planning (1989), Goodness (1991), Shear (1993), Mimi's
ghost (1994), An italian education (1995) e Europa (1997) -
este último finalista do Booker Prize.
Além de romancista, Parks é contista e um respeitado tradutor da literatura italiana, tendo já trabalhado textos de Antonio Tabucchi, Giuliana
Tedeschi, Alberto Moravia e Italo Calvino, entre outros. Após se mudar para a Itália em 1981 (onde vive com sua família numa pequena cidade perto de Verona), tem privilegiado - a exemplo de seu primeiro efetivo best-seller (Italian neighbours - uma narrativa não ficcional sobre os costumes provincianos do norte da Itália publicada em 1992) - o milieu geográfico-cultural
daquele país como pano de fundo para tramas que primam pelo detalhismo descritivo e uma sempre-consistência,
no que tange ao enredo, em torno da psicologia 'seca' dos personagens que cria.
É o caso de Cara Massimina (seu quinto romance, publicado em 1990, e adaptado para a televisão por Denis Potter) cujo enredo é simples e instigantemente 'cinematográfico' (não é a toa que "está prestes a virar filme" como bem anuncia o texto na orelha do livro). À guisa de um roteiro (o clima lembra um pouco o de Os imorais, de Stephen Frears, graças a seu estofo simultaneamente hilário, cínico e perverso), conta a história de Morris Duckworth - espécie de alter ego de Parks que também estudou em Cambridge, mudou-se para Verona e é professor) - e de sua idéia fixa de enriquecimento. Premido pelas
aviltantes circunstâncias (passadas e presentes) de sua 'estrangeiridade', pela pressão cotidiana de uma (sobre)vida mediocrizada e repetitiva, Morris não hesita em subsumir o outro como 'qualquer um' - é o caso de Massimina, uma jovem, ingênua e rica aluna cujo única falta é estar por ele apaixonada - numa aventura sem escrúpulos e que se complica à medida que se desenrola.
A colorida trama de Cara
Massimina envolve todos os ingredientes que se poderia esperar de um
romance bem-sucedido: um caso de amor, um seqüestro, uma investigação policial,
uma fuga, assassinatos (cf. o requinte sanguinolento da cena em que o Signor
Giacomo e sua companheira inglesa Sandra Delaforce são, a exemplo de Massimina,
arrastados para o mesmo buraco do 'qualquer um' por Morris), suspense,
suspeita, etc. Vale novamente dizer que tudo é muito bem amarrado por Parks
(esse parece ser o seu principal trunfo) em torno das peculiaridades
psicológicas dos personagens e, ainda por cima, avivado por um estilo, sem
dúvida, agudo, fluido e de fácil degustação. Sucesso garantido.
O Globo,
13/12/97.
[email protected]