Minha querida amiga:
Sim, é para você mesma que estou escrevendo - você
que aquela noite disse que estava com vontade de me pedir conselhos, mas
tinha vergonha e achava que não valia a pena, e acabou me formulando
uma pergunta ingênua:
- Como é que a gente faz para esquecer uma pessoa?
E logo depois me pediu para que não pensasse nisso, e prefiro lhe
responder assim pelas páginas de uma revista - fazendo de conta
que me dirijo a um destinatário suposto.
Destinatário, destinatária... Bonita palavra: não
deveria querer dizer apenas aquele ou aquela a quem se destina uma carta,
devia querer dizer também a pessoa que é dona do destino
da gente. Joana é minha destinatária. Meu destino está
em suas mãos: a ela se destinam meus pensamentos, minhas lembranças,
o que sinto e o que sou: todo este complexo mais ou menos melancólico
e todavia tão veemente de coisas que eu nasci e me tornei.
Se me derem para encher uma fórmula impressa ou uma ficha
de hotel eu poderei escrever assim: Procedência - Cachoeiro de Itapemirim:
Destino - Joana. Pois é somente para ela que eu marcho. No táxi,
no bonde, no avião, na rua, não interessa a direção
em que me movo, meu destino é Joana. Que importa saber que jamais
chegarei ao meu destino?
(Rubem Braga)
Imagem de
|