CONTRAPONTO

Para morrer um grande amor, por suposto é necessário
um grande amor ter vivido.
Se morre o amor de repente,
ontem era hoje não é, talvez se trate de amor,
mas grande não terá sido.
 

Para morrer um grande amor
recomenda-se
os transportes fantásticos,
os abraços fanáticos
e os desesperos drásticos.
 

Importante ao grande amor,
para morrer dignamente,
que durante o morticínio
resvale no antigamente,
cresça no declínio,
louve a loucura premente
mas, nunca perca o fascínio.
 

Para morrer um grande amor
supõe-se
que a epiderme,
roçando na epiderme,
fique assim: nada acontece.
O primeiro sintoma de que
o amor adoece.
O grande amor vai morrer
porque a alma não se enleva
quando acorda ou adormece.
 

Para morrer um grande amor é
indispensável
que dado por falecido,
eis que o amor recrudesce! e
renovam-se
os abraços fantásticos,
os  os desesperos fanáticos
e os transportes drásticos.
Parece
que o amor convalesce.
 

Para morrer um grande amor,
o amor terá abandonado o coração
e dele se reapossado.
Sem qualquer explicação.
Ou razão.
 

Os sentidos não tem nexo.
O amor pensa ser feito?
fez-se sexo.
Julga-se satisfeito?
simples reflexo.
 

Para morrer um grande amor,
o amor há-de ser
ardiloso:
Parece ardente, voraz, ansioso.
Puro engano.
Adoecido de morte,
o amor é cauteloso.
 

Para morrer um grande amor
exige-se
em um só ato,
cometer assassinato.
O amor endurece a voz e,
no último segundo,
diz ao amor moribundo:
não há futuro pra nós.
 

O amor agonizante,
convencido do seu fim,
rasteja, implora, diz que não,
esse amor de perdição...
 

Mas, para morrer um grande amor,
Não há quem possa negar,
tem que haver perfídia.
O amor homicida
puxa as cordas,
enlaça,
envolve,
aconchega,
usa olhos de manteiga e
o amor expirante
recobra a força num instante.
E renovam-se
os abraços fantásticos,
os transportes fanáticos e
os desesperos drásticos.
 

Para morrer um grande amor
outra forma se aconselha.
Quando o amor delirante
diante do amor se ajoelha
e pede,
suplicante,
que não o deixe morrer,
responde o amor sem ternura,
com sua voz
sibilante,
que nada se pode fazer.
Então o amor,
finalmente,
decide-se a morrer.
 

Mas, para morrer um grande amor,
outra coisa mais se exige.
É preciso que a doença
que ao grande amor aflige
tome corpo,
ganhe força,
se convença da sua sina.
E o amor que assassina
leva o amor para estágios
estranhos
Pois o amor combalido,
certo de ter morrido
retorce as
entranhas,
volta atrás,
recusa a sorte,
nega-se ä
morte.
 

Para morrer um grande amor
aplica-se
doses maciças de olhares
pungentes,
ódios adolescentes.
O amor sugere perfumes
e corrói
o amor em ciúmes.
O grande amor combalido
resguarda-se em devaneio,
agride,
ataca,
combate a morte que veio,
a morte que ainda não veio.
 

Implora o amor
aflito
e ouve resposta ao seu
grito.
O amor flutuante,
com pena do agonizante,
invoca uma lembrança
e o grande amor
explode,
do jeito que pode
e renovam-se
os abraços fantásticos,
os desesperos fanáticos e
os transportes drásticos.
 

Para morrer um grande amor?
se grande ele é
faça-me o favor,
renascerá talvez,
Pois é, pois é.

 Paulo P.
 

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