I
Por que tu me olhas espantada?
Acaso dirás não
ter lembranças minhas?
Logo a mim, tua velha e dedicada
bá
Que te vi tão nova,
tenra e pequititinha
Ainda impúbere, lactente
e empoada
Fino fragmento, pura poeira
despida
Lançada em parto cósmico,
siderada
Vagavas atônita, atomicamente
desunida
Procuravas referências,
urgias ser nucleada
Sem saberes teu destino certo
na vida
II
Serias uma formosa e esbelta
estrela
Para nos doces véus
da noite cintilar?
Serias um despótico
e colorido planeta
Para ter vida, morte, terra,
água e ar?
Serias um delicado e dedicado
satélite
Orbitando, criando marés,
lendas e luar?
Ou serias uma sinistra e
triste nebulosa
Empanando com rugas e mágoas
o teu brilhar?
Poderias ser ainda um viril
e errante asteróide
Nas encruzilhadas do firmamento
a navegar?
III
Quem fostes, és ou
serás, já desconheço
Embora teus argumentos sejam
controversos
Não perdi por ti meu
fiel afeto, meu apreço
Mesmo neste correr de bilhões
de anos perversos
Conheço tua história,
tua caminhada, desde o começo
E hoje, com outras mais novas,
sento e converso
Vái amiga, cresce
e neste infinito espaço vira gente
Vive teu sonho Via Láctea,
enquanto, nos meus, fico imersa
Tu me vês, daí,
através da ótica de lentes divergentes
Como velha e anã,
como a menor galáxia do universo!
©Gabriel Ribeiro, 22/03/2000