"A per-versão não-oficial dos fatos"
Vem da gávea o esperado
grito solitário,
lá pelas tantas da
manhã d’um dia de abril,
do faminto, mas atento marujo
hereditário,
que de atento entre tantas
águas, terra viu.
Fedido corpo, olhos inchados,
mareados,
da luta no mar denso, água
velha do barril,
mal dormido, mal sonhado
e não-amado,
voz rouca, seca, profunda
para o ar partiu,
e a frase louca inundou o
céu de sol alado
- “Terra à Vista!”
...e foi encontrado o Brasil...
A Vossa Alteza, escrevo do
achamento
desta nova terra que a Coroa
construirá
Envio este breve email em
atachamento
contando-lhe tudo que a TV
não divulgará.
São índios
e índias pelados da cabeça aos pés
mostrando tudinho do corpo
para nós infiéis
machos retidos e desgastados
por esta viagem
vendo as gajas desnudas como
em bordéis,
Vossa Alteza há de
convir deste desconforto
de encontramos logo este
paraíso como porto.
Mal passado algum tempo, a
terra então mudou,
o homem nu foi lenta e culturalmente
dizimado
plantou-se a lavoura da ganância
que importou
irmão negro trazido
como bicho escravizado,
que no tronco padeceu, suou,
gritou e sangrou,
enquanto o sacerdote, por
Deus, equivocado,
orou e cantou em latim, de
banzo o negro chorou,
e deste sangue penoso nosso
roçado foi irrigado,
as malocas deram lugar a
muitos cruéis espigões
orixás e pajelança
acabaram em reza e orações.
Vossa Alteza deve e pode,
certamente, contar como certo,
que desta terra que
o comandante chamou de Vera Cruz
todos que nela ficaram se
julgam os matreiros mais espertos
achando que o gingado e brejeirice
das ancas sempre seduz
e batucando forte dançarão
nos braços da aguardente decerto
a noite toda sem importar-se
que do dia já chegou o raio de luz,
mas este pobre povo que se
julga supimpa, malandro e liberto,
nada percebe, como cabra-cega,
tateia na escuridão do capuz
acreditando até que
seu país já foi um dia por Cabral descoberto
não vendo a honra
do povo necrosando pela corrupção em pus!
Majestade, meu Rei amado da
Coroa Portuguesa,
aqui encerro esta missiva
de não sei quantos kabites
consternado com que, ora
vos relato, com certeza
mas por obrigação
de escrivão coloco em nosso site
repito e afirmo que isto
aqui era para ser uma beleza
que o Comandante Pedro
Álvares despediu-se numa light
partindo para as Índias
tão distantes e de outras riquezas
jamais desviou-se da rota,
portando-se como nobre do society,
mas não sabia o Comandante,
qual rebento um dia ele pariu
Hoje lá está
nas Américas, o pobre moçoilo, coitado Brasil!
©Gabriel Ribeiro, 28/04/2000