F O N T E  D E  P O E S I A

Enrique Banfi / Silvana Perl
 
 


 
 
 

E torna transparente o gesto opaco




            Já sabemos, a linguagem é a morada do ser. Mas esta linguagem se bifurca a cada passo da caminhada e empreende, na sua plasticidade, enormes aventuras ou entra em trilhas mesquinhas. Pode ser a conversa de comadres falando mal da vida alheia, a língua dos burocratas, os discursos dos políticos, a cantada do fariseu vendendo sua mercadoria, o código do especialista ou o texto do filósofo. Pode ser a palavra materna que embala o filho ou a história fantástica contada pelo  pai. O discurso amoroso ou a confissão do fracasso. A fala ressentida ou o apoio amigo. A linguagem pode se transfigurar no conto que narra a história preciosa e que, na sua máquina interna, guarda seu segredo de tal forma e nos faz esquecer do enredo e somos envolvidos pela maneira de contar. Ou no romance que nos leva para outro mundo e, na fala do narrador, torna tangível toda uma época ou outro universo distante da nossa experiência. Entre todas as formas, como reserva de potência da linguagem, está a linguagem do poeta, a que lapida o mundo e traz para perto o que, estando ao lado, nem percebíamos, e que, num único verso, multiplica nosso olhar sobre as coisas e torna transparente o gesto opaco.
            Se a palavra poética traz o mundo lapidado para perto, Enrique Banfi e Silvana Perl levam para o mundo brutalizado pelo cotidiano a palavra poética, distribuindo poesia em suas projeções sobre a cidade, eles fazem com a palavra aquilo que os mestres tingidores faziam com as tintas no mundo cinza e monocromático dos homens, com seus pigmentos, davam-lhe cores nos tecidos, nos muros, nas paredes de casas e palácios. Banfi e Perl tingem com o sentido, suas cores estão prontas e eles vão recolhê-las nos livros de poesia - hoje, aprisionados em raras estantes -, trabalham com os múltiplos significados e com os sons das palavras projetadas sobre a fonte ou sobre o barco, sobre o velho chafariz que o artista Valentim desenhou e construiu, ainda no século XVIII, para levar água aos barcos dos viajantes, ou espalham poesia sobre a paisagem da praia.
 
 

                                Paulo Sergio Duarte
 




 
 
 
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